Contrariando Justiça, profissionais de saúde continuam fazendo acupuntura

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Saúde. Fisioterapeutas, psicólogos, enfermeiros e farmacêuticos não interromperam atendimento, apesar do TRF ter anulado resoluções que regulamentavam a prática por não médicos; alheios à polêmica, pacientes seguem tratamento nos consultórios

Dias após o Tribunal Regional Federal da 1.ª Regional ter tornado nulas resoluções de conselhos de farmácia, psicologia, enfermagem e fisioterapia que regulamentavam a prática da acupuntura por seus associados, os profissionais dessas especialidades continuam atendendo os seus pacientes.

"A decisão em momento algum fala que a acupuntura é ato exclusivo do médico. Ela suspende o efeito de resolução dos conselhos, e essas entidades vão recorrer. A forma como o Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura divulgou a decisão está gerando dúvida e insegurança", disse o biomédico Fernando Lyra Reis, presidente do Sindicato de Acupuntura do Rio de Janeiro.

No entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM), porém, a decisão restringe a atividade à carreira médica. Os demais conselhos discordam da interpretação e vão recorrer.

O primeiro efeito, segundo Reis, foi a enxurrada de telefonemas de pacientes, querendo saber se os consultórios haviam sido fechados; o segundo foi o cancelamento de matrículas em cursos de especialização em acupuntura. "Tínhamos uma turma que começaria no sábado com 18 alunos e 2 desistiram, porque não queriam investir dois anos de estudos sem saber se poderão atuar mais tarde", afirmou.

A acupuntura começou a ser praticada no Brasil nos anos 60. O Conselho Federal de Fisioterapia foi o primeiro a reconhecer a prática, em 1985. Dez anos depois, outros cinco conselhos fizeram o mesmo, entre eles o de Medicina. Hoje, há 60 mil acupunturistas não médicos, segundo a Associação de Medicina Chinesa e Acupuntura Tradicional do Brasil (AMCT)e 9 mil médicos associados ao Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).

Não há legislação que regulamente a prática no Brasil. Os defensores da tese de que outros profissionais podem exercer a acupuntura lembram que tanto a Organização Mundial de Saúde (OMS) quando o Ministério da Saúde reconhecem o caráter multiprofissional da atividade.

"É inadmissível que em pleno século XXI ocorra uma tentativa de mudar práticas consagradas, reconhecidas por instituições de renome. A prática por outros profissionais de saúde é que proporcionou o aumento do acesso da acupuntura ao paciente", diz Walter Jorge João, presidente do Conselho Federal de Farmácia.

Segundo o ministério, as consultas de acupuntura no Sistema Único de Saúde (SUS) passaram de 181.983, em 2003, para 621 mil, no ano passado.

Disputa. Desde 2000, o CFM questiona judicialmente as resoluções de quatro conselhos que regulamentavam a prática da acupuntura por seus associados. "Visando alargar seu campo de trabalho, esses conselhos se autorregulamentaram e autorizaram seus profissionais a praticar atos que a legislação não permite. Um farmacêutico não atende paciente nem examina nem pede exame complementar, muito menos pratica uma intervenção invasiva, que é a aplicação de agulhas", afirmou Fernando Genschow, integrante do CMBA.

Umas das preocupações de Genschow é com erros de diagnóstico. "Uma dor na coluna pode ser metástase de câncer", diz.

Sohaku Bastos, que integra a diretoria da AMCT, lembra que a medicina tradicional chinesa trata o indivíduo como um todo. "Não há diagnóstico de doença. O ato acupuntural é terapia de promoção da saúde e prevenção, não é medicina alopática. O ato médico, sim, é de cura da doença e remediação de problemas."

O vice-presidente do CFM, Carlos Vital, rebateu: "Não estamos na China. Praticamos medicina baseada em evidências, dentro da racionalidade científica. Diagnóstico é ato médico".

Alheios à polêmica, pacientes continuaram indo aos consultórios. No Academia Brasileira de Arte e Ciência Oriental, em Copacabana, onde os acupunturistas têm formação em Psicologia e Fisioterapia, o movimento foi normal. "É perseguição. O atendimento aqui é ótimo. A primeira consulta levou uma hora. O médico quando fala com você já está olhando para o relógio", diz a professora Marluce Azevedo, de 62.

 



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